Quem já viveu na sua prática a seguinte situação:
Após alguns dias do uso de amoxicilina para um quadro infeccioso que pode ser uma otite, rinossinusite ou amigdalite, surgiu um exantema maculopapular?
E agora? Preciso suspender esse antibiótico? Troco de classe?
As penicilinas são a classe de medicamentos mais comumente associadas a alergia. Cerca de 5 a 10% dos pacientes relatam alguma forma de alergia a penicilina durante o seu uso. Quando o paciente é hospitalizado esse número chega a mais de 15%.
Alguns desses pacientes apresentam manifestações imediatas quando em uso desses antibióticos, até mesmo com anafilaxia e outros, se apresentam reações tardias de hipersensibilidade.
Nessa hora, surge a dúvida: devo contraindicar o uso dessas medicações em ambos os casos?
Existe alguma situação em que eu posso prescrever novamente a penicilina, com segurança?
Se precisar trocar o antibiótico, qual outro deve utilizar sem correr o risco de reações cruzadas de hipersensibilidade?
Esse diagnóstico de alergia a penicilina precisa ser feito com cuidado, porque os pacientes assim rotulados acabam recebendo antibióticos de mais largo espectro, com maior custo, maior chance de efeitos colaterais indesejados como diarreia por Clostridium e muitas vezes essas escolhas são menos eficazes para algumas infecções.
Para responder a essas perguntas vamos entender melhor sobre quais medicamentos estamos falando:
Temos as Penicilinas naturais: PenV oral, benzatina, procaína e cristalina
Penicilina anti-estafilococica: oxacilina
Aminopenicilinas: amoxicilina, amoxicilina-clavulanato e ampicilina
Penicilinas de espectro extendido: piperacilina
É importante categorizar como foi essa reação para avaliar o risco de uso subsequente da medicação.
Na história clínica, deve ser investigado:
1- Qual penicilina, qual dose e via de administração?
2- Estava em uso de algum novo medicamento concomitante?
3- Estava em vigência de algum quadro viral?
4- Quais eram exatamente os sintomas?
Manchas elevadas, vermelhas e pruriginosas com duração de cada lesão inferior a 24 horas, que nos fazem pensar em urticária?
Inchaço da boca, olhos, lábios ou língua (angioedema)?
Bolhas ou úlceras envolvendo os lábios, boca, olhos, uretra, vagina ou descamação da pele (observadas em Síndrome de Stevens-Johnson, necrólise epidérmica tóxica, ou outra reação grave tipo IV?)
Alterações respiratórias ou hemodinâmicas (anafilaxia)?
Dores nas articulações (observadas na doença do soro)?
A reação envolveu órgãos como rins, pulmões, fígado ou linfonodos (observados em
sintomas sistêmicos erupção cutânea eosinofilia (DRESS) ?
5- Qual foi o momento da reação após tomar penicilina: minutos, horas ou dias depois?
Começou após a primeira dose ou após várias doses?As reações imediatas começam classicamente dentro de uma hora após a dose inicial ou dentro de uma hora da última dose administrada. As reações imediatas às penicilinas são frequentemente mediadas por imunoglobulina E (IgE) e e sinais e os sintomas refletem a ativação generalizada de mastócitos.
Reações tardias (não imediatas) geralmente aparecem após mais de uma dose de droga e tipicamente após dias de tratamento. Por exemplo, erupções maculopapulares cutâneas tardias à amoxicilina começam classicamente no dia 7 a 10 de tratamento e pode até começar 2 semanas após a interrupção do tratamento.
Existem diferentes mecanismos subjacentes a várias formas de reações tardias, mas não são mediados por IgE. Acredita-se que sejam mediados por células T na pele.
6- Como a reação foi tratada? Precisou de adrenalina, sugerindo anafilaxia, precisou de ir a um serviço de emergencia? Foi hospitalizado?
7- O paciente tolerou uma medicação semelhante como uma cefalosporina, depois do inicio do quadro de alergia? Devemos lembrar que existem os quadros com o uso do antibiótico de reações não alergicas: nausea, diarreia, vaginite por candida, paciente que nunca usou penicilina porque tem historia familiar de alergia.
Qual seria a opção terapeutica para esse caso de reação tardia leve não IgE mediada em uma outra ocasião:
O risco de reatividade cruzada entre penicilinas e cefalosporinas é baixo, e o risco com carbapenêmicos é ainda menor.
Podemos admisnitrar penicilina ou cefalosporina de primeira ou segunda geração usando uma dose de teste ou teste de provocação.
Em que consiste essa dose teste? O paciente recebe 1/10 da dose oral ou intravenosa, sob supervisão, monitorizado, intra-hospitalar com adrenalina e difenidramina do lado. Observa 1h, não teve reação, administra o restante da dose e observa mais 1h. Se a dose teste for tolerada sem sintomas, isso prova que o paciente não tem uma alergia imediata ao antibiótico que foi administrado.
Para concluir, classificaríamos a reação cutânea de uma criança como de baixo risco se todos os itens a seguir estiverem contemplados:
●A reação foi limitada à pele e consistiu em erupção maculopapular (a maioria
comum)
●A reação ocorreu dias após o início do antibiótico (em comparação com horas após a
primeira dose)
● Não envolveu as membranas mucosas ou bolhas ou descamação da pele
● Não envolveu edema nas articulações ou febre
● Não exigiu glicocorticóides sistêmicos para controlar os sintomas (já que isso pode indicar uma reação mais grave)
E sem dúvidas, o diagnóstico correto dessa alergia tem um grande impacto na vida dessa criança, pois essas classes de antibióticos são uma arma poderosa que temos para combater a maior parte das infecções na pediatria.
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Referências: UpToDate: Penicilin Allergy: Delayed hipersensitivity reactions
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